“Essa montanha é tão histórica e significa tanto para essa
corrida, especialmente na 100ª edição”.
A imagem e as aspas acima dão uma ideia do que representam
os 20,8km do Mont Ventoux a 7,5%. Não escalarei o assunto. A foto é do
colombiano Nairo Quintana Rojas, 6º no geral e agora líder entre os “jovens”,
que chegou aos 1912m de altitude 29s depois do britânico Chris Froome, líder no
geral a autor da frase.
Rápido e sempre
A etapa mais longa do Tour de France-100 ficou pra trás em
um ritmo intenso. O francês Sylvain Chavanel, 1º a alcançar a base do Ventoux,
tinha média de 46,7 km/h depois de 4h45min pedalados, com vantagem de 1min45s
do pelotão – nessa altura ainda existia um pelotão. Antes, o francês integrou a
fuga acompanhado de 8 competidores.
Entre os 9 da fuga, quem tinha o interesse mais claro era
Peter Sagan: adicionar pontos à sua liderança entre os sprinters. Próximo da
intermediária que premiava o 1º com 20 pontos, o eslovaco se posicionou à
frente do grupo e se cansou de olhar pra trás. Nem precisou neutralizar
possíveis ataques (como o de Chavanel, da Omega Pharma-Quick Step, que poderia
tentar ajudar o companheiro Mark Cavendish “tomando” alguns pontos do líder da
Cannondale) e nem houve sprint.
Enquanto isso, a Movistar ditava o ritmo do pelotão e
evitava descansar para a escalada. Quando ela chegou, o 1º a ficar pra trás foi
Sagan. A meta já tinha sido atingida, claro. Tinha? Depois de concluir os 242
km do dia mais de 28min atrás de Froome, o eslovaco declarou: “Fui para a fuga
para conseguir alguns pontos, mas também tinha em mente chegar no top 10 no
Mont Ventoux. Teria sido algo especial”. Teria. Mas é um daqueles sonhos que
seria engraçado se não fosse triste... Ainda consigo só me divertir com a
afirmação, assim como com a empinada e o tchau que deu ao pelotão quando foi engolido. “Esse
aceno é por diversão, para as pessoas. Dá uma foto legal, não?”. Dá, sim.
Agora Sagan só pensa em sobreviver como puder à semana mais
difícil do Tour. Os 99 pontos de vantagem sobre Cavendish, vice-líder na
“disputa” pela camiseta verde, dispensam comentários.
No alto da montanha
No pé do Ventoux foi a vez da Sky tomar a dianteira com
todos os 7 da equipe (2 já abandonaram), seguida pela Radioshack(?). Depois de
dropar o camiseta verde, imediatamente em seguida foi o francês Pierre Rolland,
então líder entre os montanhistas, que não aguentou. E seguiram, em resumo, a:
- 18 km do fim: 3
Skys já tinham ficado, Froome tinha a companhia de outros 3.
- 15 km: Depois de
concluir 1/4 da subida, a vantagem de Chavanel para o pelotão era de 1min25s.
- 14 km: Só 3 da
fuga original estavam na frente: Chavanel (a 56s), Markel Irizar (Radioshack) e
Christophe Riblon (AG2R La Mondiale). Falando em Radiochack, o pelotão era
reduzido em um ritmo mais intenso que a média de velocidade. Andy Schleck foi
deixado pra trás de maneira violenta, assim como Andreas Kloden e
posteriormente Irizar. O luxemburguês, cercado de boatos sobre sua saída da
equipe após o irmão mais velho, Frank, ser chutado prestes a completar sua
suspensão por doping, não se preocupa.
- 13 km: O
espanhol Mikel Nieve supera Chavanel e assume a dianteira, com 54s de vantagem.
No pelotão, o primeiro ataque é de Quintana, então 8º no geral a 5min18s. Sem
resposta. Entre os concorrentes da Sky, Nicolas Roche, da Saxo-Tinkoff, fica
pra trás.
- 12 km: Quintana
também passa Chavanel. É a hora da alfinetada do dia no Twitter. Momentos
antes, o ao vivo do site do Tour listou os melhores Movistars na classificação
geral – Valverde (17º) e Rui Alberto Costa (18º). A equipe respondeu em tuíte
posteriormente deletado que Quintana podia não ser favorito ou muito grande
(1,67m de altura e 59kg), mas era o 8º na disputa. Um lapso do Tour ao virar as
costas para os concorrentes à camiseta branca. No reduzido pelotão, Froome tem
Richie Porte e Peter Kennaugh ao seu lado. Alberto Contador tem 3 companheiros:
Roman Kreuziger, Michael Rogers e Jesus Hernandez.
- 11 km: Só 23
integram o pelotão, 39s atrás do líder. Cadel Evans, campeão há dois anos,
mostra que a forma não é mais a mesma.
- 10 km: Quintana
e Nieve dividem a liderança, a 40s. Enquanto Contador marca a roda de Froome, o
grupo segue forte, agora sem Evans.
- 9 km: Depois do
trabalho cumprido com a Sky, Kennaugh quase para na estrada. A Belkin, com os top
5 Bauke Mollema e Laurens Ten Dam, fica sem Robert Gesink.
- 8 km: Quintana
lidera por apenas 15s. Com a violência de uma tarifa de ônibus, o “pelotão” é
reduzido a 4(!!) ciclistas: Froome e Porte X Contador e Kreuziger. O tcheco
logo deixa o espanhol em maus lençóis sozinho com os Skys.
- 7 km: O ataque
mais absurdo desta edição até o momento. Contador responde por poucas dezenas
de metros até que em uma curva Froome não vê nem sinais do espanhol ao olhar
pra trás. Em 20s(!!!) o britânico alcança Quintana e mantém a aceleração, que o
colombiano responde.
- 6 km: Froome e
Quintana têm 14s de Contador, que começa a trabalhar junto com o compatriota
Nieve, da Euskaltel - Euskadi.
- 5 km: 24s. Grupo
com 5 top 10 (Mollema, Kreuziger, Ten Dam, Jakob Fuglsang e Joaquin Rodriguez)
mais Valverde e Rogers já leva 1min11s.
- 3,5 km: Contador
a 50s. Grupo de Mollema a 1min30s.
- 2 km: Contador a
52s. Grupo de Mollema, agora sem Valverde, a 1min40s.
- 1,3 km: Froome
assume a dianteira sozinho, no que não considerou um ataque a Quintana.
“Esperava ganhar tempo, mas não vencer a etapa. No final não acho que ataquei,
só (Quintana) que não conseguiu acompanhar”. O colombiano de apenas 23 anos
concorda. “Pensei que ele (Froome) estaria menos forte do que estava, mas ele
fez um esforço violento e eu simplesmente não pude acompanhar”. O Mont Ventoux
estava vencido depois de 5h48min45s de etapa, a 41,7 km/h.
Depois da curva
Antes do dia de descanso, Froome ampliou a vantagem sobre
tudo mundo, é claro. O top 5 segue na mesma ordem: Mollema, Contador, Kreuziger
e Ten Dam. As diferenças (2min28s, 2min45s, 2min48s e 3min01s) são mais
expressivas (4min14s, 4min25s, 4min28s e 4min54s). Suficientemente expressivas para
evidenciar o favoritismo do britânico. Fosse em outras edições, com a rota
“mais leve” na última semana, o título estaria garantido. Não está, porque em
uma única montanha pode-se tirar muito tempo. E os perfis das próximas etapas
são assustadores:
- Terça-feira: Montanhas
3-2-2. O dia mais tranquilo, apesar da organização dar o coeficiente para a
etapa como 4. Em uma escala de 1 a 6, em que 6 são apenas os time trials, o 5
indica os dias mais “difíceis”, o 4 um pouco menos difíceis e assim por diante.
Os 242 km com o Ventoux também foram classificados como 4. Torço para que
esteja enganado, mas os 168 km desta terça devem ser mornos e o top 5 vai ficar
se estudando e nenhum ataque vai ser bem sucedido.
- Quinta-feira:
2-3-2-HC-2-HC. Talvez a etapa que mais mereça ser vista – a 1ª que a
organização dá coeficiente 5. Os hors concours são o histórico Alpe-d’Huez, que
todos escalarão uma vez para descer e subir de novo. Nos últimos 64 km da
etapa, 29,1, oficialmente, serão de montanhas categorizadas. Haja EPO!
- Sexta-feira:
HC-HC-2-1-1 (coeficiente 4)(?). A etapa merece atenção porque atinge os 2000m
de altitude no Col de La Madeleine, a 2ª escalada. O fato do dia começar com 2
HCs diminui as chances de ataques. Concorrentes que ficarem pra trás terão
quase 80 km pra trabalharem em equipe ou até mesmo com outros concorrentes em
busca da recuperação nas fáceis montanhas 2-1-1. E a etapa termina com 13 km de
descida...
- Sábado:
2-3-3-3-1-HC. O último dia com montanhas decentes podia trazer mais sofrimento
se não tivesse apenas 125 km. Difícil imaginar que aquele que liderar até sexta
perca a vantagem no sábado. O estranho coeficiente é 5, talvez só pela chegada
ser em HC.
Fora da curva
Emblemático |
No dia que os poetas imortalizaram a metamorfose do
atletismo à
ciclismo, duas ponderações.
- O ciclismo ensina que o maior fica por último.
- Interessante reparar que cada matéria gasta, no mínimo, 1
parágrafo / 20s de reportagens que têm 4 parágrafos / 30s para explicar quem é
Tyson Gay e Asafa Powell, por exemplo. O autorreconhecimento do que é um país antiolímpico
de verdade. Daqueles que precisam de legenda pra foto abaixo.