16 de setembro de 2012

Enfim, o fim


Fazia tempo que um final de semana não reunia tantos destaques de tênis para o Brasil. Ao menos em quantidade, o meio de setembro mostrou um final, um possível começo e, quem sabe, recomeços.

Em semana sem ATPs, as atenções sempre estão na Copa Davis e um longo caminho de volta ao grupo Mundial foi percorrido durante 9 anos. A queda para o Grupo 2 das Américas e 6 anos seguidos ficando perto. Temporadas sem ter adversários no grupo 1 das Américas, mas com derrotas inesperadas (Equador, em Porto Alegre, em 2009), inexplicáveis (Índia de Devvarman e Bopanna, em 2010) e indigestas (Rússia, com dois match points, em 2011).

A mesma Rússia do ano anterior cruzou o Atlântico e só repetiu um jogador da convocação de Kazan. Sem a experiência dos top 50 Mikhail Youzhny e Nikolay Davydenko, sobrou para Igor Andreev e Teymuraz Gabashvili se deliciarem no saibro de São José do Rio de Preto. No papel, a melhor chance do Brasil considerando o momento dos jogadores de cada equipe, o piso, a torcida, o clima, etc.


Expectativa que se cumpriu sem a tradicional tensão de Copa Davis. Os sustos, talvez, foram no set que Gabashvili tirou de Bellucci, no vacilo de Melo/Soares ao abrirem 5/1 e só fecharem o set inicial por 7/5 e o set point que a dupla russa teve no terceiro set. Poderia ter significado um gás extra para o jogo, ainda que dificilmente Bellucci perderia no domingo contra o baleado Andreev ou se o capitão russo o trocasse por Alex Bogomolov.

Tirando Andreev, que foi peça importante no vice de 2007, a Rússia trouxe ao Brasil tenistas com 1-3 (Gabashvili), 0-2 (Bogomolov) e 0-0 (Stanislav Vovk) em Davis. Mesmo sem os dois “cortados” em cima da hora, os europeus ainda tinham dois nomes com mais vivência em Davis e algumas posições à frente de Gabashvili no ranking mundial: Dmitry Tursunov e Igor Kunitsyn. O primeiro marcou ponto nas duplas na final de 2006 e sacramentou a vitória sobre o Brasil no ano passado, no quinto jogo.

 A pouca experiência aliada à falta de vontade de viajar ao Brasil para jogar no saibro (enquanto as duplas rolavam, no sábado, Tursunov comemorava vaga na final do Challenger de Istambul, em quadra dura) tiraram a Rússia do Grupo Mundial após 20(!) anos. O preço que se paga às vezes é alto demais.

Na reta
Mas nem só de Davis vive o tênis (e, principalmente, quem não é top 100). O Challenger de Cali viu três brasileiros na semifinal, com Thiago Alves eliminando Fabiano de Paula (que entra pela primeira vez na carreira no grupo dos 300 do mundo) e caindo para Feijão na final. Alves confirma o bom recomeço que teve início com o título do Aberto de São Paulo, na primeira semana do ano, e já ganhou mais de 200 posições na temporada. Feijão, que há exatamente um ano atingia sua melhor colocação no ranking (84º), mostra que pode salvar a temporada de aprendizado em ATPs recuperando pontos preciosos em Challengers. Com muita coisa a acontecer até o próximo confronto da Davis, em 2013, os dois não podem ser descartados como opções para João Zwetsch. Principalmente Alves em quadra dura.

André Sá foi vice no Challenger de Petange, com o britânico Jamie Murray. No feminino, a número 1 brasileira, Teliana Pereira, fez sua quarta final na temporada e ficou com o vice no ITF US$ 25 mil de Mont-De-Marsan. A ex-top 20 juvenil Laura Pigossi conquistou seu primeiro título como profissional, no ITF US$ 10 mil de São José dos Campos. Ela eliminou duas cabeças de chave em sets diretos e, na final, mesmo sofrendo um pneu da experiente Maria Fernanda Alves – cabeça 1 –, levou a melhor com 7/5 no terceiro set. Uma das promessas do tênis brasileiro começa a dar os primeiros passos no profissional.

Caixa de brita
Nem só de Brasil vive a Davis. Nos outros 9 confrontos relevantes do final de semana, apenas a Bélgica definiu o confronto no sábado e não permitiu que a Suécia, órfã de Robin Soderling, evitasse o inevitável. Sem tenistas entre os 400(!!) do mundo, os suecos ressuscitaram Andreas Vinciguerra, 33º do mundo em 2001 e que não jogava desde julho de 2011, que até conseguiu tirar 12 games de David Goffin, mas a equipe deixa a elite da competição após 12 anos. Para 2013, a Suécia espera a volta de Joachim Johansson, Magnus Norman, Thomas Enqvist e Bjorn Borg em busca do acesso.


No Grupo Mundial, a Espanha tomou sustos no primeiro dia, com Sam Querrey abrindo 1 set a 0 contra David Ferrer e Nicolas Almagro precisando de 4h16 contra John Isner. Ainda com a dupla baleada, o favoritismo dos irmãos Bryan foi confirmado, mas Ferrer colocou fim à Davis dos sonhos de Isner, em 4 sets, e colocou os atuais campeões em mais uma final.

Em Buenos Aires, o primeiro dia se mostrou decisivo após Juan Martin Del Potro não ter condições de jogo para o domingo. Juan Monaco poderia ter aberto 2 a 0 no confronto, chegou a 4 a 2 no quarto set contra Tomas Berdych e perdeu oito(!!!) games seguidos. Ainda devolveu as duas quebras no set decisivo e, quando foi sacar em 4/5, perdeu o serviço de zero, frustrando a sensacional torcida no Parque Roca.

Mesmo sem as inúmeras opções que Alex Corretja tem para convocar a Espanha, a República Tcheca jogará em casa para tentar devolver a surra da decisão de 2009 e conquistar o título inédito pós-Tchecoslováquia.

Roger Federer e Stanislas Wawrinka foram encarregados de evitar o rebaixamento da Suíça e fizeram 2 a 0 com facilidade na sexta-feira contra a Holanda. A dupla repetiu as Olimpíadas de Londres e o número 1 do mundo deve ter adorado tem que voltar à quadra no domingo para confirmar o terceiro ponto.

A Alemanha teve o saibro como grande aliado contra a Austrália. O jovem Cedrik-Marcel Stebe abriu o confronto perdendo para o também jovem Bernard Tomic e a dupla Lleyton Hewitt / Chris Guccione colocou os australianos em vantagem. No último dia, porém, os visitantes não conseguiram um set, com Tomic derrotado por Florian Mayer e Stebe frustrando o recorde de confrontos de Hewitt pela Austrália. 

Os cazaque-russos viraram contra o Uzbequistão e têm menção honrosa somente porque podem ser adversários do Brasil. Aliás, o melhor sorteio no retorno ao Grupo Mundial seria receber cazaques ou austríacos (a confirmar no ranking de amanhã qual dessas equipes será cabeça de chave).

Japão 2 X 3 Israel, Canadá 4 X 1 África do Sul e Itália 4 X 1 Chile não merecem mais linhas.

Depois da curva
Menção honrosa do final de semana à Índia, que ganhou seu primeiro confronto desde a fatídica vitória sobre o Brasil em 2010. Depois de perderem para Sérvia e Japão em 2011 e caírem para o grupo 1 da Ásia / Oceania, haviam perdido para o Uzbequistão em abril e corriam risco de rebaixamento para o Grupo 2. Venceram a fortíssima Nova Zelândia por 5 a 0.

Fotos: Site Copa Davis

1 de setembro de 2012

Escalada sem fim


É um roteiro sem fim. Uma biografia que merece atualização a cada semana. O câncer, depois a volta à vida e ao ciclismo. As sete conquistas seguidas da prova mais dura do planeta, o romance com uma celebridade, a arrecadação de fundos para ajudar pacientes da doença a qual sobreviveu. Milhares de acusações, centenas de testes antidoping, dezenas de declarações para tirar o final feliz do conto de fadas. Dos adversários, dos ex-companheiros de equipe e talvez até da ex-noiva-celebridade.

A história tem muitas reviravoltas para tentar ser entendida, quanto mais explicada. E os capítulos das 2 últimas semanas indicam que a novela pode acabar amanhã ou nunca ter fim. Talvez não seja a montanha mais difícil, mas com certeza é a mais longa da (ex-?) carreira de Lance Armstrong.

A retirada de todos os títulos como profissional desde agosto de 1998 e o banimento do esporte profissional pelo resto da vida, anunciado pela Usada, traz duas hipóteses opostas de imediato. Ou Armstrong sempre competiu dopado e havia um acordo com a Usada para encobri-lo (semelhante com o que a ATP fez com Andre Agassi uma vez – pelo menos a única divulgada pelo próprio ex-tenista). Por algum motivo, esse acordo chegou ao fim e o estrago foi feito. Ou Armstrong sempre correu limpo e é realmente vítima da “caça às bruxas” que alega – agora não só da Usada, como de muitos ex-companheiros. Os testes, à época, foram todos negativos, enquanto dezenas de adversários eram advertidos ou punidos pelo uso de EPO, esteroides, transfusões de sangue, etc. O ciclismo está cheio de exemplos.

Uma questão posterior é: Por que o poder da Usada é superior ao da União Internacional de Ciclismo (UCI)? A entidade máxima do ciclismo mundial não deu um veredicto sobre a punição e cobra da Usada que mostre as evidências dos exames em que Armstrong falhou. Aguardemos.

Coincidentemente, havia terminado de ler Lance Armstrong: Muito mais do que um ciclista campeão; minha jornada de volta à vida um dia antes da desistência do americano em continuar se defendendo. E relacionei sua atitude com a cabeçada de Zidane ao final da carreira. Se querem acreditar ou não, certo ou errado, culpado ou inocente, foda-se.

Floyd Landis, Tyler Hamilton e Lance Armstrong
Coincidentemente (ou não), um ex-companheiro de Armstrong lançaria uma autobiografia-bomba no dia do aniversário do heptacampeão (?), 18 de setembro, e adiantou para o próximo dia 5. Tyler Hamilton ajudou Armstrong a conquistar os 3 primeiros títulos no Tour com a US Postal Service e depois virou seu adversário pelas equipes CSC e Phonak. Admitiu seu próprio doping  - assim como acusou Armstrong e inúmeros ex-companheiros – em uma entrevista no final de 2011 e no início de agosto teve a medalha de ouro dos Jogos e Atenas-2004 retirada pelo COI. No livro A luta de Lance Armstrong, do jornalista Daniel Coyle (coincidência ou não, o mesmo que assina a biografia de Hamilton), os dois são apresentados como amigos, apesar de rivais, e apenas um teto separava suas apartamentos em Girona durante os longos treinamentos na Europa.

No livro-bomba (“The Secret Race: Inside the Hidden World of the Tour de France, Doping, Cover-ups and Winning at All Costs”), Hamilton revela transfusões de sangue que fez junto de Armstrong no Tour de 1999 e diz que “Lance trabalhava o sitema… Lance era o sistema”, segundo cópia que a Associated Press conseguiu antecipadamente. Ele ainda dá detalhes do esquema de EPO, que os líderes e os médicos da equipe (US Postal Service) encorajavam a prática. Marketing ou não, é uma boa estratégia de divulgação.

Como se não bastasse, o Daily Mail ressuscita que até sua ex-noiva, a cantora Sheryl Crow, foi interrogada em 2011 a respeito das acusações. Os dois conviveram entre 2003 e 2006, quando o ciclista foi menos esportista e mais celebridade. Nunca se soube o teor de suas declarações.

Continuando, Outside traz um texto de um ex-assistente de Armstrong, dizendo acreditar que o ciclista trapaceou, não é e nunca foi uma vítima – além de explorar a tão falada e (re) conhecida arrogância do ex-campeão.

Enquanto os próximos capítulos não chegam, Armstrong ironiza a decisão da Usada. Seu agente, Bill Stapleton, evita comentar o(s) caso(s). O veterano belga Eddy Merckx, um dos maiores ciclistas de todos os tempos e 5 vezes campeão do Tour,lamenta a polêmica e diz que acredita em Armstrong – em sua biografia de 2000, o norte-americano o descreve como um grande amigo. Os norte-americanos George Hincapie e Levi Leipheimer, dois dos maiores escudeiros de Armstrong ao longo de sua carreira, teriam garantido, no início de julho, que testemunhariam à Usada contra o compatriota. Alberto Contador, em meio à Vuelta a Espanha em seu retorno de suspensão por doping, trata de ser político e ficar de meias-palavras. Oscar Pereiro, que herdou o Tour de 2006 após a desclassificação de Floyd Landis (ex-companheiro de Armstrong) por doping, diz que o caso é patético e lança dúvidas sobre o sistema de antidoping.

Depois da curva
A maioria dos grandes adversários de Armstrong ao longo da carreira foi pega em exames antidoping e muitos – vice ou bronze no Tour, ouro em Jogos Olímpicos – tiveram as devidas punições. Se todos estavam trapaceando, entre todos os dopados, Armstrong ainda foi o melhor. É como diz o poeta: seria cômico se não fosse trágico.

Na reta
Quando interrompeu a aposentadoria para retornar ao ciclismo em 2009, a principal justificativa de Armstrong fora que o esporte havia perdido espaço na mídia sido manchado por casos de doping, como o de Landis, em 2006. Se até hoje o principal assunto ciclístico ainda é o norte-americano, ele ajuda em evidência nas notícias com a polêmica. Mas, ao desistir de se defender, coloca um fim nas pautas do esporte que o consagrou (caso essa montanha de história tenha algum fim).